Segurança de crianças na internet: especialistas de Joinville orientam como responsáveis devem agir
Especialistas orientam como identificar riscos e proteger crianças de conteúdos perigosos na internet
Especialistas orientam como identificar riscos e proteger crianças de conteúdos perigosos na internet
Elas estão a um clique do perigo, e muitas vezes, sozinhas. Especialistas de Joinville alertam como o ambiente digital pode expor crianças e adolescentes a riscos graves, como desafios perigosos, jogos violentos e aliciadores virtuais. Sem uma legislação específica para esses casos, o combate depende de um trabalho conjunto entre polícia, escola e, principalmente, os pais, que devem acompanhar de perto o que os filhos fazem on-line.
A coordenadora estadual da Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (Dpcami), delegada Patrícia Maria Zimmermann D’Ávila, informa que neste ano, até o momento, não há registros específicos na coordenadoria sobre crianças ou adolescentes feridos em Joinville por causa de brincadeiras ou desafios perigosos divulgados na internet.
Patrícia ressalta que, como os desafios virtuais são fenômenos relativamente novos, o trabalho da polícia se baseia na adaptação às condutas já previstas em lei. No Brasil, ainda não existe uma legislação penal específica para casos envolvendo desafios perigosos ou conteúdos digitais que coloquem crianças e adolescentes em risco.
Situações como essas são enquadradas em crimes já previstos no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como induzimento ao suicídio, lesão corporal, exposição a constrangimento, divulgação de pornografia infantil, etc. Por isso, o enfrentamento desses casos depende da interpretação da lei e da atuação integrada entre polícia, escolas, conselhos tutelares e principalmente das famílias.
Patrícia explica que a identificação e o monitoramento desses casos dependem de denúncias e da análise cuidadosa de ocorrências, já que muitas vezes os registros não usam os termos específicos que se popularizam nas redes.
Portanto, um dos desafios enfrentados pela polícia é a ausência de um tipo penal específico que trate sobre o tema. “A gente trabalha com os tipos penais que já têm definidos”, informa. Assim, os casos acabam sendo enquadrados em outros crimes.
Para identificar precisamente esses casos, seria necessário um filtro detalhado nas ocorrências registradas, segundo ela. Isso porque há registros envolvendo desde empurrões até lesões provocadas em ambiente escolar. Quando o autor tem menos de 12 anos, o caso geralmente é encaminhado apenas ao Conselho Tutelar.
Durante o período em que atuou como conselheiro tutelar em Joinville (2014-2025), o professor Cristóvão Petry acompanhou alguns casos de crianças e adolescentes envolvidos em desafios perigosos divulgados na internet, embora não fossem frequentes. Segundo ele, essas situações geralmente chegavam ao conselho por meio de escolas ou familiares.
Apesar disso, Patrícia informa que a Polícia Civil de Santa Catarina já atua há bastante tempo no monitoramento de conteúdos on-line que envolvem brincadeiras perigosas ou jogos que expõem crianças e adolescentes a riscos. Ela citou como exemplos casos que ganharam repercussão nacional, como o “jogo da Baleia Azul” e o chamado “Homem Pateta”.
Ela menciona que a viralização de vídeos, mesmo os aparentemente inofensivos, preocupa as autoridades pela facilidade com que alcançam o público infantil e adolescente.
A delegada ressalta a importância dos pais estarem sempre atentos e monitorando o que as crianças consomem, pois esses desafios, mesmo quando aparentemente inofensivos, podem evoluir para situações graves. “Esse tipo de conteúdo se espalha com rapidez pelas redes sociais, o que amplia ainda mais o potencial de danos”, alerta.
Após mais de 15 anos afastado da sala de aula, ao voltar a lecionar em 2025, o professor Cristóvão Petry percebeu que o comportamento de crianças e adolescentes mudou drasticamente. Ele percebe uma diferença “gritante” na capacidade de concentração dos estudantes. “O nível de concentração das crianças é muito pequeno e elas são muito influenciadas pelo que veem na internet e redes sociais”, comenta.
As crianças de hoje já nascem conectadas à internet, e isso influencia diretamente o ambiente escolar, segundo Cristóvão. “Algumas brincadeiras se tornam violentas porque a criança é influenciada pela violência dos jogos on-line”, relata o professor. “Mas eu ainda acredito no poder da educação com afeto”, complementa.
Apesar desse cenário, ele considera positiva a decisão de proibir o uso de celulares nas escolas, o que tem feito a diferença, segundo ele. No entanto, o professor ainda observa dificuldades nas relações interpessoais. “As crianças precisam interagir e tenho percebido a dificuldade que elas têm de aceitar o outro, de realizar trabalhos em grupo, de conversar e conviver”, comenta.
Patrícia explicou que a Diretoria de Inteligência da Polícia Civil é o setor responsável pelo monitoramento de conteúdos perigosos nas redes sociais. Segundo ela, esse trabalho é contínuo e envolve o acompanhamento de movimentações que representam riscos a crianças e adolescentes. “É um trabalho que não para, porque a violência na internet também não para”, afirma.
Ela destaca que a atuação da inteligência já permitiu evitar diversas situações graves, como atentados em escolas e tentativas de suicídio. Um dos casos ocorreu no Oeste de Santa Catarina, quando a polícia conseguiu intervir durante uma transmissão ao vivo de um jovem tentando tirar a própria vida. “Esse tipo de prevenção é possível graças ao trabalho integrado da equipe de inteligência e às parcerias com provedores de redes sociais”, informa.
Além desse monitoramento permanente, a coordenadora cita as operações “Luz da Infância” como exemplo de ação efetiva. Essas operações, realizadas em âmbito nacional, têm como foco a identificação e prisão de pessoas envolvidas na transmissão de conteúdo relacionado à exploração sexual de crianças e adolescentes. O material costuma circular por redes abertas e privadas, e a polícia chega aos suspeitos a partir do rastreamento digital.
Patrícia também alertou para a existência de grupos organizados em ambientes virtuais que disseminam conteúdos violentos, como apologia ao nazismo, incentivo ao armamento ilegal e organização de ataques. Ela lembrou que o caso do jogo Baleia Azul é um exemplo de como conteúdos perigosos podem ganhar alcance global e afetar diretamente crianças no Brasil.
“A gente tem que esclarecer à população que tudo que é feito pelas redes virtuais sempre deixa vestígios. E a investigação sempre vai tramitar pra por esses vestígios”, informa a delegada.
Embora os crimes cometidos em ambientes virtuais deixem rastros, as investigações enfrentam obstáculos práticos. Segundo Patrícia, um dos principais desafios é a falta de acesso dos pais a informações básicas dos dispositivos dos filhos, como senhas de celulares e aplicativos. Isso dificulta o trabalho policial, que muitas vezes precisa recorrer à Justiça para quebrar senhas e acessar dados essenciais à apuração dos fatos.
Cristóvão Petry defende que os pais devem limitar ao máximo o acesso dos filhos à internet e às redes sociais. Além disso, ressalta a importância de orientar e fiscalizar o uso, estabelecendo uma relação de confiança para que filhos se sintam à vontade em compartilhar o que acontece. Segundo ele, essa abertura e presença dos responsáveis faz muita diferença na proteção dos filhos.
A delegada reforça a importância de os pais acompanharem de perto a navegação dos filhos, observando com quem se comunicam e que tipo de conteúdo acessam. Ela orienta que, ao identificar conteúdos suspeitos ou criminosos, os responsáveis procurem a polícia e, se possível, levem o dispositivo eletrônico utilizado, pois isso pode ajudar diretamente na investigação.
Patrícia destaca que, em casos de urgência, como quando uma criança se fere e está com o celular em mãos, a ausência dessas informações pode atrasar a investigação. “Quando a gente consegue ter essas informações de pronto, fica bem mais fácil agir rapidamente”, afirma. O envolvimento dos responsáveis, segundo ela, é fundamental para prevenir situações graves e facilitar o trabalho da polícia.
“Os pais precisam entender que o dever de educar vem antes do direito à privacidade dos filhos no uso do celular e da internet”, alerta a delegada. Ela explica que esse cuidado pode evitar que os jovens se tornem vítimas de criminosos que estão na internet o tempo todo dispostos a cometer crimes graves.
Ela reforça que os pais devem estar atentos ao comportamento dos filhos e manter uma presença ativa no cotidiano digital. “Muita coisa poderia ser evitada se as famílias acompanhassem mais de perto o que os filhos fazem on-line”, ressalta. O controle prévio e o diálogo com a criança são medidas fundamentais para que situações graves nem cheguem a acontecer.
Cristóvão observa que a escola tem um papel importante na orientação de alunos e famílias sobre os riscos do ambiente digital, mas destaca que a responsabilidade principal é dos pais ou responsáveis, que devem estar atentos e comprometidos com a proteção dos filhos.
Ele defende que o enfrentamento dos riscos digitais só será eficaz com um trabalho conjunto entre escola, família, Conselho Tutelar, saúde e polícia. “Cada um fazendo a sua parte, todos juntos pra conter essa situação”, menciona. Segundo ele, é essencial que cada instituição atue de forma integrada e que haja uma campanha ampla de conscientização, pois crianças estão sendo gravemente afetadas, e até morrendo, por esses conteúdos.
O professor reforça a importância de denunciar qualquer situação que coloque em risco os direitos de crianças e adolescentes. “É importante não ter medo de enfrentar esse problema. Não desista, a criança e o adolescente precisam de orientação, limite e afeto”, finaliza.
A coordenadora estadual da Dpcami explica que há iniciativas preventivas voltadas à conscientização de crianças e adolescentes sobre os riscos da exposição on-line. Em Joinville, uma psicóloga da Polícia Civil desenvolve o projeto “Proteja uma Criança”, que aborda os perigos da violência sexual contra crianças e adolescentes.
Além disso, foi lançado o projeto “Conhecer para se Proteger”, realizado em parceria com a Polícia Civil, o Poder Judiciário e a Secretaria de Estado da Educação. “A ação tem como foco os alunos do ensino médio e trata diretamente dos perigos da internet, como a deep web, a dark web e os cibercrimes”, informa Patrícia. Policiais civis entram em sala de aula para explicar os riscos e alertar os estudantes sobre crimes graves cometidos nesse ambiente.
Segundo Patrícia, a escolha dessa faixa etária se deve ao fato de que adolescentes do ensino médio têm aparecido com frequência em investigações como alvos ou autores de crimes on-line. Ela citou uma operação da Polícia Federal, na qual um dos envolvidos na prática de um crime era um jovem de uma escola pública de Criciúma, dentro desse perfil.
A coordenadora ressaltou que o objetivo do projeto é sensibilizar os adolescentes antes que se envolvam em práticas criminosas. A atuação nas escolas busca oferecer informação e prevenção, num esforço conjunto para proteger esse público considerado vulnerável.
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