“A arte me abraçou”: morador de Joinville aprende a pintar com a boca após ficar tetraplégico
José Souza dos Santos ficou tetraplégico após um acidente no rio Piraí aos 33 anos
José Souza dos Santos ficou tetraplégico após um acidente no rio Piraí aos 33 anos
A arte para algumas pessoas é algo a ser apreciado. Para o morador de Joinville José Souza dos Santos, de 54 anos, significa recomeço após um acidente que o deixou tetraplégico aos 33 anos. Desde então, José pinta quadros com a boca, uma técnica que aprendeu vendo vídeos no Youtube.
“Fiquei tetraplégico com 33 anos por conta de um mergulho no rio Piraí. Sempre fui acostumado com mergulho, tomava banho no rio e pulava, nada acontecia”, relata. Aquela foi a primeira vez que José visitou o rio Piraí e estava com outros seis amigos. Ele conta que o primeiro mergulho foi bem-sucedido, mas na segunda vez José escorregou e caiu na margem do rio, batendo em pedras.
Com o acidente, José perdeu os movimentos do pescoço para baixo. Por um tempo, o morador de Joinville teve dificuldade em aceitar sua condição. “A primeira coisa que pensei foi em como conseguir trabalhar e o que eu poderia fazer da vida. Não via soluções”, conta.
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José precisou fazer terapia ocupacional, fisioterapia e acompanhamento médico intensivo nos primeiros meses. A rotina de José é agitada, com fisioterapia às terças e quintas-feiras, terapia ocupacional às quartas-feiras e arteterapia às quintas-feiras à tarde no Instituto Cultural Ademar Cesar.
Com a fisioterapia, ele conseguiu recuperar alguns movimentos do braço, que o auxiliam na movimentação da cadeira e para conduzir os pincéis até a boca. “Eu faço exercícios [na fisioterapia] para manter os movimentos que consegui ganhar. Eu também fico com muita dor na área da nuca e maxilar, pois eu movimento muito essa área para pintar”, relata.
A ideia de pintar com a boca surgiu na terapia ocupacional, quando um professor viu vídeos no YouTube que ensinavam a técnica tanto com a boca quanto com os pés. “Eu fiquei com aquilo na minha mente e comecei a querer fazer aquilo também. Foi como descobrir que ainda existia um mundo de possibilidades”, conta.
José nasceu no Espírito Santo, mas foi criado em Rondônia. Passou pelo Amazonas, Curitiba e Blumenau, antes de se estabelecer em Joinville. Atualmente, ele vive com o irmão em uma casa que recebeu de herança dos pais. A irmã também ajuda nos cuidados. “Sempre tive alguém disposto a me ajudar, essa cidade me ajudou e me abraçou”, completa.
Com a ideia na mente, José começou a assistir os vídeos no YouTube e adaptando o que aprendia para as suas limitações. Ele começou com desenhos em folha sulfite e tinta guache. “Fiquei oito meses pintando assim, pintava tudo que via e pensava. Tudo para treinar muito e aprender”, explica.
O contato com a tinta profissional veio após José começar a frequentar a Casa da Cultura e o Instituto Cultural Ademar César. Foi com a tinta profissional que o morador de Joinville começou a ver melhora nos desenhos que fazia. “O professor Ademar César me apresentou a tinta óleo e foi ali que me apaixonei, já que o material me dá tempo de mexer e arrumar o que errei ou não gostei”, conta.
Para José, a tinta óleo lhe deu mais autonomia na hora de pintar. Foi assim que ele começou a comprar telas e se aventurar nisso. “Foi uma alegria só porque eu descobri algo que poderia aprender. Quando você perde tudo, começa a ver felicidade nessas coisas”, acrescenta José.
Agora, a pintura é uma forma de José ganhar dinheiro. Por isso, ele investe em pincéis, tinta e tela, porém sempre ganha de conhecidos. Com o tempo e experiência, José também achou formas de facilitar o manuseio com o pincel. Uma delas foi a adaptação dos pincéis com objetos em formato de canudo para “alongar” o material. “Os pincéis são muito curtos, me fazendo ficar muito perto da tela, desse jeito consigo pintar em uma distância confortável”, conta.
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Quando vai realizar o esboço, José coloca o lápis no lugar do pincel. “Eu não me considero um pintor, ainda estou aprendendo, mas amo isso, amo pintar. É meu momento de distrair a mente, meus pensamentos ficam todos longe e eu consigo ter um momento meu”, relata.
Para iniciar um quadro, José primeiramente escolhe uma imagem, fazendo o esboço do que pretende fazer. Seus quadros são adaptações de obras já feitas ou imagens da internet, utilizadas como referência. “O autor da obra pinta com a mão e eu com a boca, sempre sai algo diferente e adaptado”, conta.
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José fez uma releitura do quadro do professor Ademar César neste ano. A pintura foi motivo de elogio. “Ele disse que foi a releitura mais próxima da pintura dele e isso me deixou muito feliz. Foi gratificante”, conta.
Para pintar completamente o quadro, José demora, em média, um mês. Depois são necessários 15 dias para a tinta secar e a obra estar completamente finalizada. “A arte me abraçou. Um quadro em branco é um mar de possibilidades”, completa.
Antigamente, José tinha um computador que o auxiliava na escolha de desenhos e principalmente na procura por novos vídeos para aprofundar suas técnicas. “Meu computador estragou e por mais que eu tenha o celular é difícil, pois a tela é pequena e o celular precisa ficar no meu colo, me causando muita dor em estar na mesma posição”, explica. Pensando nisso, a sobrinha de José criou uma vaquinha.
A vaquinha tem como objetivo arrecadar R$ 3 mil para a compra de um novo computador que poderá auxiliar José. Para ajudar, basta doar por meio da vaquinha online ou pela chave Pix [email protected].