“A arte me abraçou”: morador de Joinville aprende a pintar com a boca após ficar tetraplégico

José Souza dos Santos ficou tetraplégico após um acidente no rio Piraí aos 33 anos

“A arte me abraçou”: morador de Joinville aprende a pintar com a boca após ficar tetraplégico

José Souza dos Santos ficou tetraplégico após um acidente no rio Piraí aos 33 anos

Yasmim Eble

A arte para algumas pessoas é algo a ser apreciado. Para o morador de Joinville José Souza dos Santos, de 54 anos, significa recomeço após um acidente que o deixou tetraplégico aos 33 anos. Desde então, José pinta quadros com a boca, uma técnica que aprendeu vendo vídeos no Youtube.

“Fiquei tetraplégico com 33 anos por conta de um mergulho no rio Piraí. Sempre fui acostumado com mergulho, tomava banho no rio e pulava, nada acontecia”, relata. Aquela foi a primeira vez que José visitou o rio Piraí e estava com outros seis amigos. Ele conta que o primeiro mergulho foi bem-sucedido, mas na segunda vez José escorregou e caiu na margem do rio, batendo em pedras. 

José faz parte do Instituto Cultural Ademar Cesar desde 2011. | Crédito: Yasmim Eble/O Município Joinville

Com o acidente, José perdeu os movimentos do pescoço para baixo. Por um tempo, o morador de Joinville teve dificuldade em aceitar sua condição. “A primeira coisa que pensei foi em como conseguir trabalhar e o que eu poderia fazer da vida. Não via soluções”, conta. 

José precisou fazer terapia ocupacional, fisioterapia e acompanhamento médico intensivo nos primeiros meses. A rotina de José é agitada, com fisioterapia às terças e quintas-feiras, terapia ocupacional às quartas-feiras e arteterapia às quintas-feiras à tarde no Instituto Cultural Ademar Cesar.

Com a fisioterapia, ele conseguiu recuperar alguns movimentos do braço, que o auxiliam na movimentação da cadeira e para conduzir os pincéis até a boca. “Eu faço exercícios [na fisioterapia] para manter os movimentos que consegui ganhar. Eu também fico com muita dor na área da nuca e maxilar, pois eu movimento muito essa área para pintar”, relata. 

José aprendeu a técnica vendo vídeos no YouTube e praticando. | Crédito: Yasmim Eble/O Município Joinville

A ideia de pintar com a boca surgiu na terapia ocupacional, quando um professor viu vídeos no YouTube que ensinavam a técnica tanto com a boca quanto com os pés. “Eu fiquei com aquilo na minha mente e comecei a querer fazer aquilo também. Foi como descobrir que ainda existia um mundo de possibilidades”, conta.

José nasceu no Espírito Santo, mas foi criado em Rondônia. Passou pelo Amazonas, Curitiba e Blumenau, antes de se estabelecer em Joinville. Atualmente, ele vive com o irmão em uma casa que recebeu de herança dos pais. A irmã também ajuda nos cuidados. “Sempre tive alguém disposto a me ajudar, essa cidade me ajudou e me abraçou”, completa.

Aprendendo do zero

Com a ideia na mente, José começou a assistir os vídeos no YouTube e adaptando o que aprendia para as suas limitações. Ele começou com desenhos em folha sulfite e tinta guache. “Fiquei oito meses pintando assim, pintava tudo que via e pensava. Tudo para treinar muito e aprender”, explica. 

O contato com a tinta profissional veio após José começar a frequentar a Casa da Cultura e o Instituto Cultural Ademar César. Foi com a tinta profissional que o morador de Joinville começou a ver melhora nos desenhos que fazia. “O professor Ademar César me apresentou a tinta óleo e foi ali que me apaixonei, já que o material me dá tempo de mexer e arrumar o que errei ou não gostei”, conta. 

Espaço de pintura de José. | Crédito: Yasmim Eble/O Município Joinville

Para José, a tinta óleo lhe deu mais autonomia na hora de pintar. Foi assim que ele começou a comprar telas e se aventurar nisso. “Foi uma alegria só porque eu descobri algo que poderia aprender. Quando você perde tudo, começa a ver felicidade nessas coisas”, acrescenta José. 

Agora, a pintura é uma forma de José ganhar dinheiro. Por isso, ele investe em pincéis, tinta e tela, porém sempre ganha de conhecidos. Com o tempo e experiência, José também achou formas de facilitar o manuseio com o pincel. Uma delas foi a adaptação dos pincéis com objetos em formato de canudo para “alongar” o material. “Os pincéis são muito curtos, me fazendo ficar muito perto da tela, desse jeito consigo pintar em uma distância confortável”, conta. 

Quando vai realizar o esboço, José coloca o lápis no lugar do pincel. “Eu não me considero um pintor, ainda estou aprendendo, mas amo isso, amo pintar. É meu momento de distrair a mente, meus pensamentos ficam todos longe e eu consigo ter um momento meu”, relata.

Processos da pintura

Para iniciar um quadro, José primeiramente escolhe uma imagem, fazendo o esboço do que pretende fazer. Seus quadros são adaptações de obras já feitas ou imagens da internet, utilizadas como referência. “O autor da obra pinta com a mão e eu com a boca, sempre sai algo diferente e adaptado”, conta. 

José fez uma releitura do quadro do professor Ademar César neste ano. A pintura foi motivo de elogio. “Ele disse que foi a releitura mais próxima da pintura dele e isso me deixou muito feliz. Foi gratificante”, conta. 

Releitura feita por José do quadro de Ademar Cesar. | Crédito: Yasmim Eble/O Município Joinville

Para pintar completamente o quadro, José demora, em média, um mês. Depois são necessários 15 dias para a tinta secar e a obra estar completamente finalizada. “A arte me abraçou. Um quadro em branco é um mar de possibilidades”, completa. 

Vaquinha para um computador

Antigamente, José tinha um computador que o auxiliava na escolha de desenhos e principalmente na procura por novos vídeos para aprofundar suas técnicas. “Meu computador estragou e por mais que eu tenha o celular é difícil, pois a tela é pequena e o celular precisa ficar no meu colo, me causando muita dor em estar na mesma posição”, explica. Pensando nisso, a sobrinha de José criou uma vaquinha.

Crédito: Yasmim Eble/O Município Joinville

A vaquinha tem como objetivo arrecadar R$ 3 mil para a compra de um novo computador que poderá auxiliar José. Para ajudar, basta doar por meio da vaquinha online ou pela chave Pix [email protected].


Palácio Episcopal foi construído para primeiro bispo de Joinville, inspirado no estilo barroco:

Colabore com o município
Envie sua sugestão de pauta, informação ou denúncia para Redação colabore-municipio
Artigo anterior
Próximo artigo