Debates acalorados marcam última audiência pública sobre reforma administrativa de Joinville

Última audiência foi marcada por críticas de servidores e preocupação com possíveis perdas de direitos no novo estatuto

Debates acalorados marcam última audiência pública sobre reforma administrativa de Joinville

Última audiência foi marcada por críticas de servidores e preocupação com possíveis perdas de direitos no novo estatuto

Lara Donnola

A Câmara de Joinville realizou nesta segunda-feira, 23, a última das três audiências públicas para discutir os 19 projetos da reforma administrativa proposta pela prefeitura com os servidores municipais. A audiência foi marcada por forte participação dos servidores públicos, debates acalorados e críticas intensas às propostas da reforma administrativa.

O Secretário de Administração e Planejamento de Joinville, Ricardo Mafra, apresentou uma explicação dos 7 projetos que estavam em análise hoje, explicando sobre a divisão do estatuto dos servidores. Há 36 alterações propostas no estatuto do servidor. Ao dizer que a maioria das alterações são uma mera atualização de texto ele foi vaiado e a plateia se manifestou discordando. Ao longo da audiência, o presidente da Câmara, Diego Machado (PSD), precisou pedir silêncio à plateia diversas vezes.

Segundo Ricardo, a proposta traz mudanças na avaliação de desempenho, com a ampliação para 14 critérios de análise. Ele destacou que o novo modelo também passará a incluir gestores, inclusive os comissionados. Outra mudança no estatuto é a possibilidade de progressão funcional para servidores readaptados, considerando o cargo de origem. Durante alguns momentos da fala, ele foi achincalhado pelo público presente.

O secretário explicou que o controle de jornada para servidores comissionados e aqueles que ocupam funções gratificadas já é uma prática vigente, implantada por meio de decreto. Segundo ele, a proposta atual é incluir esse procedimento no estatuto do servidor, garantindo um marco legal para essa exigência. “Hoje já existe essa obrigatoriedade, os comissionados já fazem o registro de ponto, mas queremos colocar isso no estatuto para consolidar legalmente esse controle de jornada”, afirmou.

Segundo o secretário, o impacto máximo que os projetos podem causar é de R$ 90 milhões de reais. A vereadora Vanessa da Rosa (PT) criticou o impacto financeiro estimado da reforma e questionou a destinação desses recursos. Segundo ela, com esse valor, seria possível regulamentar a carreira de todos os servidores e garantir aumento real. “Temos falta de dentistas, médicos, auxiliares de inclusão, mencionou.

Mauro Schlieck/CVJ

Posicionamento de sindicatos

A presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais (Sinsej), Mara Tavares, destacou a importância do estatuto do servidor, lembrando que ele rege a vida funcional dos servidores desde o ingresso no serviço público até após a aposentadoria. “O que está sendo discutido é a vida de cada servidor público municipal ativo e inativo”, ressaltou.

Ela demonstrou preocupação com as mudanças propostas na reformulação do estatuto, especialmente com a recorrente menção à palavra “decreto” no novo texto. “É uma pequena mudança no texto, mas essa palavra aparece incontáveis vezes. Isso significa que o estatuto não engessa, ele flexibiliza. Mas flexibiliza de um modo muito ruim para a categoria, porque essa flexibilização dá mais poder ao prefeito para fazer alterações nas nossas vidas”, afirmou Mara.

Maciel, professor no serviço público e diretor do Sinsej, também concorda que essa possibilidade de alterações via decreto compromete a segurança jurídica dos servidores. “Sabem o que é decreto? É dar a caneta na mão do prefeito e falar ‘faz o que tu quiser da minha vida’”, comentou. O plenário da Câmara estava lotado de servidores públicos segurando cartazes dizendo: “Nossos direitos não podem ser mudados por decreto”.

Vanessa da Rosa também aponta que a alteração do estatuto dos servidores públicos municipais pode representar perda de direitos. “Muitos pontos definidos por decreto causa insegurança jurídica. É um conjunto de maldades que desestimula o ingresso no serviço público e abre espaço para justificar terceirizações e privatizações”, menciona.

Mauro Schlieck/CVJ

Outra questão apontada pela presidente do Sinsej foi a avaliação do estágio probatório. Atualmente, esse processo ocorre em períodos definidos, mas a proposta da nova redação permite que ele seja feito a qualquer tempo. “A gravidade disso é que o avaliador pode aplicar uma avaliação justamente num momento em que o servidor está se opondo a alguma decisão da chefia, por exemplo. Isso fragiliza ainda mais a posição do servidor”, alertou.

“Nós, servidores, não estamos simplesmente nos opondo. A nossa oposição a essa reforma é fundamentada”, afirmou a presidente do Sinsej. Ela definiu a proposta como “cruel” em alguns aspectos e criticou a gestão dos recursos públicos. “Um prefeito que compromete os cofres públicos ao direcionar boa parte dos recursos para beneficiar alguns, enquanto retira justamente dos que mais precisam da atenção do governo”, disse.

“A reforma, se bem conduzida, poderia beneficiar todos, mas ela vem para privilegiar o primeiro escalão e prejudicar quem está na linha de frente do serviço público”, disse Vanessa. Para a vereadora, a medida pode ter fins eleitorais. “Parece uma tentativa de formar um exército de cabos eleitorais para a eleição que se aproxima”.

Para Mara, a reforma atinge pontos sensíveis da carreira dos servidores com frieza. “Beneficia alguns que não vão atender a demanda da população e retira de outros que necessitam de mais desse benefício que eles têm”, pontuou.

Ela também questionou os argumentos da prefeitura sobre os benefícios da proposta. “O que a gente vê nessa reforma de modo geral? São milhões no colo de cargos gratificados e servidores sofrendo essa economia que a prefeitura diz que está trazendo para atender não sei que necessidades”, disse. Segundo ela, as leituras feitas até o momento não indicam mudanças que de fato atendam ao crescimento da demanda na cidade.

O Sinsej cobrou posicionamento dos vereadores. “Se essa casa não se sensibilizar depois de tanta busca pelo diálogo, de tanto pedirmos para que essas audiências acontecessem, depois de tudo que cada servidor trouxe, eu questiono qual é o verdadeiro papel desta casa que se diz trabalhar pelo povo e pela população de Joinville”, ressaltou Mara.

A presidente do Sinsej finalizou a fala convocando os servidores a participarem de uma assembleia marcada para esta terça-feira, 24, às 19h, na sede do sindicato, localizado na rua Lages, 84. Na pauta estão a reforma administrativa, a Campanha Salarial, o indicativo de paralisação para 1º de julho e a escolha de delegados para a 17ª Plenária Estatutária da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Mauro Schlieck/CVJ

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Serviços de Água e Esgotos Sanitários de Joinville (Sintraej), Edson, denunciou o que classificou como um desmonte contínuo dos serviços públicos na cidade, atingindo áreas como educação, saúde e saneamento.

Ele ressaltou que, assim como a reforma administrativa foi construída sem diálogo, também estaria sendo articulada, nos bastidores, a entrega da Companhia Águas de Joinville à iniciativa privada. “Querem novamente abrir o capital da empresa para as empresas privadas, para entregar de vez a companhia”, afirmou. “Estamos aqui na luta por todos os servidores públicos, contra a precarização, a terceirização e a privatização”, concluiu.

A agente administrativa Lindiara defendeu que reformas e mudanças são necessárias, mas precisam ser equilibradas. “O negócio tem que ser bom para ambos os lados”, afirmou. Para ela, o fato de haver tensão entre servidores e governo, com vereadores atuando como intermediadores, é sinal de que há perdas. “Não estamos aqui porque somos simplesmente contra a reforma, estamos querendo rever pontos”, disse.

O vereador Neto Petters (Novo) afirmou que os parlamentares ainda vão avaliar todos os itens da proposta de reforma administrativa. Para ele, a discussão sobre pontos específicos da lei deve ser feita com equilíbrio e consenso. “Minha sugestão é que, se não concordamos com um artigo, apresentemos alternativas, debatamos e vejamos juridicamente se é possível melhorar e deixar mais claro e objetivo para todos”, declarou.

Reclamações da falta de isonomia

Para a vereadora Vanessa da Rosa, a reforma é marcada pela falta de isonomia e pela forma atropelada como foi apresentada ao legislativo. “É um absurdo 19 projetos chegarem de uma vez só, com várias reuniões extraordinárias de comissão para acelerar a tramitação. Só depois de muita luta conseguimos garantir audiências públicas”, afirmou.

Vanessa aponta que a proposta privilegia alguns setores em detrimento de outros, com a criação de 50 cargos comissionados e mais de 100 funções gratificadas, sem deixar claro o impacto financeiro. “Antes, usavam o limite prudencial para negar aumento real aos servidores. Agora, isso parece não ser mais problema”, disse.

A vereadora também critica a distribuição das gratificações, que, segundo ela, não contemplam de forma justa todos os servidores. Para ela, a luta não é por gratificações, mas por aumento real nos salários. “As gratificações não são incorporadas ao salário. A nossa luta é por valorização efetiva”, mencionou.

Próximos passos

O vereador Lucas Souza (Republicanos) afirmou que participou das três audiências públicas e destacou que a Câmara tem cumprido seu papel ao ouvir a população. Ele parabenizou a mobilização de agentes e assistentes administrativos e fez um apelo ao secretário pela valorização da categoria. “Não me sentiria bem se deixássemos essa oportunidade de revisão histórica para trás”, afirmou.

Como membro da Comissão de Constituição e Justiça, Lucas garantiu que analisará o projeto do Estatuto com cautela, comprometendo-se a não permitir que nada seja feito de forma apressada ou sem o devido cuidado.

Sobre os próximos passos, a parlamentar Vanessa da Rosa demonstrou ceticismo quanto à possibilidade de mudanças significativas. “Não tenho muita esperança de que vamos conseguir reverter esse projeto. A Câmara está fechada com o prefeito”, opinou.

Ela informou que propôs suspender a tramitação dos projetos nas comissões até que o prefeito voltasse de viagem para se reunir com o sindicato dos servidores. “Meu requerimento foi rejeitado por unanimidade. Fui a única a votar a favor da suspensão. Isso diz muito sobre qual será o resultado final dessa reforma”, disse.

O vereador Lucas Souza também afirmou que foi pressionado a se posicionar politicamente durante a tramitação da reforma, mas disse não ter vergonha de reafirmar suas convicções. “Desde o primeiro dia de mandato, o meu pensamento é o mesmo, eu represento as pessoas que precisam do serviço público de qualidade lá na ponta”, comentou.

“Tem gente que quer a extinção do Estado, esse não é o meu pensamento”, afirma. Para o parlamentar, discutir Estado mínimo é algo “totalmente desconectado com a vida do joinvilense que vive nos bairros e na ponta da nossa população”. Ele reforçou que a prefeitura atende milhares de pessoas na educação e na saúde, e que essa estrutura precisa ser mantida com qualidade.

O presidente da Câmara de Joinville, Diego Machado (PSD), agradeceu a presença do público na audiência e informou que os projetos continuarão em análise nas comissões responsáveis.


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