Entenda o que é a Anomalia Magnética que fica sobre o Sul do Brasil
Faixa da Anomalia Magnética do Atlântico Sul fica nas regiões Sul e Sudeste do Brasil e vai até África
Faixa da Anomalia Magnética do Atlântico Sul fica nas regiões Sul e Sudeste do Brasil e vai até África
O significado da Anomalia Magnética do Atlântico Sul (Amas) ainda é um mistério para a ciência. Trata-se de uma espécie de defasagem na proteção magnética da Terra localizada sobre o Atlântico Sul, mais especificamente nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. A faixa se estende até o continente africano.
Para tentar entender o fenômeno, especialistas estudam o campo magnético do planeta, gerado no núcleo de ferro líquido superaquecido a pelo menos 3 mil quilômetros de profundidade. O campo magnético, uma espécie de escudo protetor contra radiação cósmica e ventos solares, surge a partir das correntes elétricas na região, entre outros fatores.
Cientistas afirmam que esse campo magnético é dinâmico. Por variar a intensidade em força e direção pode gerar efeitos como a Amas.
Conforme o astrônomo Silvino de Souza, do Observatório Astronômico de Brusque, o fenômeno Amas é conhecido desde 1958. Ele explica que ela é resultado de uma falha no campo magnético da Terra, descoberta pelo físico James Van Allen.
“Nesta falha, nós também temos uma falha na camada de ozônio. Logo após a descoberta, a Nasa resolveu sondar essa falha e foi lançado o satélite Explorer. Então foi confirmada a existência desse fenômeno”, conta.
Inclusive, o astrônomo ressalta que entre Blumenau e Gaspar tem uma falha enorme no campo magnético. “Não só no Cinturão de Van Allen, no campo magnético da Terra, mas também a diminuição a camada de ozônio. Como o campo ali é mais fraco, ele acaba perturbando as partículas do ozônio”, diz.
Segundo de Souza, durante o inverno, quando há a entrada da massa de ar frio, que se choca com a massa de ar quente vinda do Equador, em direção ao Polo Sul, ocorre um desequilíbrio: a anomalia se intensifica.
“Acontece um chacoalhação nessa região, na parte da atmosfera. Acaba que as partículas ficam mais agitadas e ocorre essas turbulências, o que chamamos anomalia. Mas isso é natural do nosso planeta e essa falha ocorre justamente aqui”, explica.
O astrônomo conta que a Anomalia tem uma altura de 20 até 23,5 mil quilômetros. Contudo, ele completa que esse fenômeno ocorre com menos intensidade. Com os satélites, é possível detectar com mais precisão e recentemente se notou que a anomalia oscilou.
A Amas ainda é estudada e monitorada por agências espaciais, como a ESA (Agência Espacial Europeia), a Nasa (agência espacial norte-americana) e também do Brasil, que lançou recentemente ao espaço um nanossatélite com essa missão, o NanosatC-BR2.
O doutor em Física e pesquisador do Observatório Nacional, Marcel Nogueira, explica que as agências espaciais querem entender o fenômeno. Ele pode avariar os satélites que passam pela órbita da Terra.
“Porque as agências espaciais têm interesse na anomalia? Porque como essa região tem um campo mais enfraquecido, as partículas do vento solar entram nessa região com mais facilidade, o fluxo de partículas carregadas que passam por aquela área é muito mais intenso. Isso faz com que os satélites, quando passam por essa região, tenham que, por vezes, ficar em stand by, desligar momentaneamente alguns componentes para evitar a perda do satélite, de algum equipamento que venha a queimar. Porque a radiação, principalmente elétrons, nessa região é muito forte. Então é de interesse das agências espaciais monitorar constantemente a evolução dessa anomalia, principalmente nessa faixa central”, explica.
A ESA já alertou para o crescimento gradativo da Amas entre 1970 e 2020. De acordo com estudo publicado em 2020, o campo magnético da Terra perdeu 9% de força nos últimos 200 anos. O maior impacto disso foi na região da anomalia.
Além do funcionamento dos satélites, especialistas alertam que com a baixa na retaguarda em um ponto específico do planeta, ficamos mais suscetíveis a tempestades magnéticas que podem afetar o dia a dia tecnológico na Terra.
Para Nogueira, entender essas particularidades pode orientar na precaução de blecautes. Um exemplo é o que ocorreu em Quebec, no Canadá, em 1989, quando milhões de habitantes ficaram sem energia elétrica e tiveram transmissões de rádio interrompidas.
“Se gente estuda as tempestades, temos condições de melhorar o nosso sistema de distribuição de energia elétrica e protegendo, evitar esses blecautes. Porque na vida que a gente tem hoje em dia, tão dependente da tecnologia, qualquer apagão no sistema elétrico, de qualquer país, gera prejuízo de milhões ou até bilhões de dólares. É algo muito importante para nossa vida tecnológica”, diz.
No Brasil, além do nanossatélite lançado ao espaço em março, em uma parceria com a Agência Espacial Russa, também há dois observatórios magnéticos. Entre outras missões, eles estão focados em responder questionamentos sobre essa anomalia. São situados em Vassouras, no Rio de Janeiro, e Tatuoca, na região amazônica. Ambos fazem parte da Rede Global de Observatórios Magnéticos, o Intermagnet.
Segundo Marcel Nogueira, os que operam no Brasil são bem modernos, apesar de o geomagnetismo ser uma das ciências mais antigas da humanidade. Ele diz que os trabalhos na órbita do planeta, realizado pelos satélites, e no solo, pelos observatórios, são complementares.
“Além de ser uma ciência extremamente antiga, de eles servirem para medidas relevantes, estudar fenômenos geomagnéticos, também servem de fonte de calibração para os satélites que estão fazendo medidas. São métodos complementares.”
Sobre o mistério da Anomalia Magnética do Atlântico Sul, popularmente associado aos eventos no Triângulo das Bermudas, Marcel prefere dizer que o fenômeno é muito mais um desafio tecnológico e que não há conclusões que apontem riscos do fluxo das radiações cósmicas na vida humana.
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