Stefany Claudino/Divulgação

Fernanda Silva
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Aos 28 anos, Tabata Cristine Barroso foi diagnosticada com autismo e transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). Apesar do diagnóstico tardio, a moradora de Joinville, hoje com 32 anos, já percebia que seu crescimento foi atípico. Enfileirava brinquedos, aprendeu a falar muito cedo, tinha sensibilidade ao toque e seletividade alimentar.

Na época, década de 1990, a família não tinha tanto conhecimento sobre o autismo. “Não tinha essa percepção. Categorizavam autismo como algo de menino, porque na época se tinha mais diagnostico de meninos”, comenta a designer gráfico.

Tabata seguiu seu crescimento, apesar dos comportamentos que traziam certa dificuldade ao dia a dia. “Só comia tomates em cubos, em rodelas não e dependia da textura [a comida]”, lembra. Com isso, teve anemia e chegou a ter raquitismo. Na adolescência, apesar de extrovertida, não tinha muitos amigos, não por preconceito, até porque não era diagnosticada na época, mas porque não se sentia encaixada.

Na vida adulta, começou a perceber algumas atitudes atípicas. No trabalho, o TDAH impedia o foco, tinha dificuldade de tomar iniciativa, organizar e planejar.  Por outro lado, com o autismo, tinha hiperfoco em coisas mais “aleatórias”, em que se agarrava momentaneamente. “Como personagens de cartoon. Passei dias vendo desenho”, conta.

Para ela, desde a escola, era difícil acompanhar duas coisas ao mesmo tempo, ouvir explicações e anotar, por exemplo. Focava em uma coisa de cada vez. “É importante entender que não é um mau comportamento, mas é uma característica da pessoa. Tem muito essa questão de impor que o autista deve mudar”, afirma Tabata.

Hoje, faz diversos tipos de terapia, como a ocupacional e foco sensorial, que ajudam a melhorar a organização, o planejamento e a adaptação.

Stefany Claudino/Divulgação

Diagnostico tardio

Apesar de já fazer terapia psicológica, passou a correr atrás de um diagnóstico que fosse de encontro com as coisas que sentia. Foi aí, há quatro anos, que descobriu ser autista e ter TDAH.

A moradora de Joinville conta que imaginava ter déficit de atenção, mas não sobre o autismo. Após o diagnóstico, foi possível entender o passado. “Minha mãe tinha essa visão do estereótipo, visão de uma criança mais dependente. Foi difícil entender que havia outras características. E aí, começou a entender, olhar o passado, das coisas que ocorreram”, lembra sobre a descoberta com a família.

De cara, encontrou algumas dificuldades para o tratamento e entender melhor o próprio caso. “Não há nada sobre autistas adultos [na internet], falava sobre criança, mas isso não se aplica em mim mais, preciso entender sobre assunto”, recorda. Tabata conta que chegou a se consultar com pediatra até conseguir ficar por dentro do diagnóstico que havia recebido.

Internet

Com a escassez de informações e profissionais que pudessem dar um suporte sobre a presença do autismo em adultos, Tabata criou um hiperfoco sobre o assunto e passou a fazer pesquisas. Hoje, tem uma conta no Instagram onde fala sobre estereótipos, preconceitos, terapias e o dia a dia. “Não queria que outras autistas se sentissem perdidas”, comenta.

Após começar a falar sobre diagnóstico é que sentiu o peso do preconceito. Ela conta que as pessoas questionam sua capacidade de ser boa profissional ou de poder manter um relacionamento.

Casada, uma conhecida da esposa Suelen comentou que não sabia como a amiga iria se casar com uma pessoa autista. “Nunca me esqueci disso”, lembra. Tabata e Suelen são casadas há quase um ano, mas há quatro se relacionam.

Arquivo Pessoal

A designer explica que há muitos estereótipos sobre os autistas, mas que cada pessoa tem seus próprios comportamentos e questões, que algumas de fato terão um grau de dependência e dificuldade de fala maior, mas que não podem ser impedidas de conviver. Ela lembra que, apesar da pauta estar sendo mais discutida, estas pessoas ainda estão a margem e são excluídas dos espaços.

Para Tabata, mostrar seu dia a dia e falar sobre a pauta é uma forma de informar mais pessoas autistas e também as típicas, para evitar falas como esta. No Instagram, o perfil dela tem mais de 26 mil seguidores.

Primeiros sinais

“Diversos sinais devem ser considerados no diagnóstico de autismo, alguns surgem. precocemente e outros vão se apresentando conforme o desenvolvimento da criança”, explica Sabrina Fagundes, psicóloga clínica do Hospital Dona Helena.

Assim como no caso de Tabata, alguns dos sinais podem ser a apresentação de padrões restritos e repetitivos de comportamentos e interesses, hiperfoco e tendência de repetir diversas vezes a mesma brincadeira ou deseja apenas determinado alimento. Entre outros comportamentos, indica Sabrina, está o déficit na comunicação social, atraso na linguagem, dificuldade na interação social ou de se expressar com os outros.

A profissional aponta que, em crianças até os 3 anos, pode-se notar diferenças entre a fase de desenvolvimento das crianças consideradas neurotipicas. Uma criança autista pode não atender ao ser chamada pelo nome, parecer ignorar o outro, não estende os braços para pedir colo, demonstra desconforto em trocas de roupas ou até mesmo de ambiente, explica Sabrina.

Sabrina também explica que, em alguns casos, o autismo também é acompanhado de algumas comorbidades, como o Transtomo de Ansiedade Infantil e o Transtorno de déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

“Muitas vezes o Transtorno de Déficit de Atenção pode confundir os familiares, e atrasar o diagnóstico correto, pois a criança autista pode apresentar um cérebro de funcionamento agitado, no entanto a dificuldade social e de linguagem estará presente para o autista”, explica.

São diversas manifestações, que podem facilitar o diagnóstico. A psicóloga sugere que profissionais sejam procurados caso os pais suspeitem de alguns sinais. Porém, ela afirma que na fase adulta, realizar o diagnóstico torna-se mais completo, confessa a profissional. Isso porque, nesta fase da vida, as pessoas já estão adaptados ao seu funcionamento e sua rotina.

Novo CID

A psicóloga explica que, segundo o Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), da Associação Americana de Psiquiatria, um dos critérios de diagnóstico para o autismo é a presença de déficit na comunicação social desde atraso na linguagem bem até a dificuldade na interação social.

Recentemente, o CID – Classificação Estatística Internacional de Doenças – foi atualizado e, agora, o autismo deixa de ter inúmeras classificações e passa a ser considerado apenas Transtorno do Espectro do Autismo, sendo que, no diagnóstico, é avaliado o comprometimento da fala e intelectual.

“Passa a ser considerado um espectro, entende-se que pode se manifestar de inúmeras formas a depender de cada criança e se toma fundamental a avaliação de um profissional em caso de suspeita, a fim de compreender a forma de manifestação e o impacto dos déficits para a criança e a família”, explica.

Terapias

A psicóloga aponta que várias ferramentas podem auxiliar no desenvolvimento do cérebro humano, independente se neurotipico ou neuroatipico. No caso dos autistas, é importante uma equipe multidisciplinar, com assistência de médico neuropediatra, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicólogo e até mesmo psicopedagogo, psicomotricista, músicoterapeuta, entre outros, sugere.

“A intervenção precoce auxilia no desenvolvimento da criança e a minimizar o impacto dos déficits, mas, fundamentalmente, oferece a ela e a família um espaço de acolhimento, escuta, aceitação e possibilita acessar ao mundo como toda criança precisa”, finaliza.