Kevin Banrque/O Município Joinville

Fernanda Silva
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Um dos maiores patrimônios de Joinville é, sem dúvida, o rio Cachoeira. Além de passar pelo Centro, as águas percorrem norte a sul da cidade até desaguarem na Baía da Babitonga.

E tudo começa nos bairros Costa e Silva e Vila Nova. É por lá que ficam as nascentes do rio Cachoeira, em meio à mata fechada, próximo à rua Rui Barbosa e ao lado da BR-101.

Há cerca de três anos, era possível acessar as nascentes do rio e contemplar o local onde um dos principais rios da cidade nasce. Mas, por conta da poluição, foi necessário fechar o caminho e interditar a via que dava acesso ao local, que, com o tempo, foi tomado pelo verde, tornando-se de difícil acesso.

Além dos bairros mais ao Norte da cidade, há outras dezenas de rios que alimentam o Cachoeira, sendo seus afluentes. Estes, vem de todos os lugares de Joinville, inclusive, do bairro Itinga, no extremo sul do município. Desatacam-se os rios Itaum-Açú, Bucarein, Jaguarão, Mathias, Morro Alto, Mirandinha e Bom Retiro. Com a ajuda deles, o Cachoeira chega encorpado no Centro da cidade.

Cômite Baía da Babitonga/Reprodução

A área total da bacia é de aproximadamente 80 quilômetros quadrados (km²), com uma extensão de 14 km no canal principal, de acordo com o Cômite Baía da Babitonga (CBB), que realiza estudos nos rios que integram a baía.

Inclusive, a vice-reitora da Univille e engenheira ambiental e sanitarista Therezinha Maria Novais de Oliveira, destaca que a metade de Joinville mora dentro da Bacia do Rio Cachoeira, que fica totalmente em território urbano.

Por suas águas correrem ao longo da cidade, o rio acaba sofrendo interferência humana como, por exemplo, a poluição registrada com frequência nas nascentes no passado, lembra Therezinha. Além disso, apenas 43% das casas aos arredores do Cachoeira possuem esgoto tratado, fator que, segundo a sanitarista, mais influencia na saúde das águas do rio.

Moradores em prol da nascente 

Morador do Costa e Silva durante as décadas de 1990 e 2010, o jornalista James Klaus viu a população do bairro crescer, principalmente nos arredores das nascentes. Em 2009, a associação de moradores começou um trabalho de limpeza de lixos na região, lembra James.

Na época, a poluição nas nascentes era muito recorrente. Em sua dissertação de mestrado, James citou que os moradores, preocupados com a poluição local, chegaram a criar um sistema de monitoramento, que flagrou funcionários de empresas, comerciantes e moradores dispensando o lixo irregular nas nascentes.

“Chegamos a montar patrulhas, fazíamos fotos para denunciar. A gente gravava e denunciava. Arrumamos alguns inimigos por conta disso”, conta.

O gerente de Desenvolvimento de Gestão Ambiental da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, Josimar Neumann, lembra que, na época, as pessoas iam até o local exclusivamente para o depósito de lixo. Ele comenta que, por conta do tamanho dos resíduos, muitos iam de carro até a nascente.

James conta que o lixo juntado no local precisava ser transportado em cinco caminhões, devido à quantidade e peso dos descartes. O antigo morador explica que eram encontrados todo o tipo de lixo: restos de compras de mercado, de feiras, materiais de construção, automotivos, graxa, entre outros.

Josimar recorda que no local onde estão as nascentes existia uma rua que terminava em um acesso à BR-101, então o movimento por ali era mais frequente.

Protegidas pela mata

A luta dos moradores em prol nas nascentes gerou frutos. Após inúmeras denúncias sobre as poluições, a população exigiu que a Prefeitura de Joinville fechasse o caminho, a fim de dificultar o acesso e descarte de poluentes no local. Em 2014, a rua de fato foi interditada.

Oito anos depois, ainda existe uma trilha, que pode ser feita a pé ou de bicicleta. A passagem de carros é impossível.

As nascentes, porém, ficaram mais protegidas. Hoje, a mata se tornou um escudo que dificulta o acesso de pedestres.

Próxima às nascentes, rua dava acesso a BR-101 | Foto: Google Maps
Após fechamento da rua, mata cresceu e fechou o acesso de veículos | Foto: Fernanda Silva/O Município Joinville
Hoje, a rua deu lugar a uma trilha. Ainda assim, o volume da mata dificulta o acesso de pedestres. Imagem de local próximo a nascente. Mata impediu a passagem da reportagem | Foto: Fernanda Silva

Falta de esgoto tratado

Ainda que a poluição da nascente prejudicasse o ambiente local, o maior vilão da poluição do Cachoeira é a falta de esgoto tratado, afirmam Therezinha e Josimar.

Apenas 43% das residências próximas ao rio têm rede de esgoto, enquanto o restante desemboca em diversos lugares, inclusive nos rios afluentes e no próprio Cachoeira.

Nos últimos anos, o CBB realizou diversas pesquisas e estudos para consultar a qualidade da água e como esta poluição também atinge os seres que ali habitam.

“Hoje, temos o trabalho para pesquisar os efeitos do consumo dos peixes do rio Cachoeira”, conta Therezinha. O objetivo é verificar quais químicos, por exemplo, são ingeridos pelo ser humano através do peixe retirado do Cachoeira. O descarte de lixo, como metal, é um desses materiais que podem acabar no organismo humano, cita Therezinha. Porém, isso ainda não pode ser afirmado, já que o estudo está em fase de andamento.

A sanitarista ambiental ressalta a importância da ampliação do tratamento do esgoto da cidade, mas lembra que ele não pode ser feito do dia pra noite. A gerente de qualidade e meio ambiente da Companhia Águas de Joinville, Claudia Rocha, explica que, atualmente, 40,9% dos moradores da cidade possuem rede de esgoto tratada. A meta é chegar a 90% nos próximos dez anos.

Enquanto esse investimento vai sendo realizado, a população também pode fazer a sua parte, deixando de descartar o lixo no meio-ambiente. Claudia conta que cerca de 4% dos moradores que podem, não estão conectados na rede de esgoto.

Avanços

Com o monitoramento da qualidade da água do rio Cachoeira, foi possível observar uma melhora conforme o avanço da rede de tratamento de esgoto, destaca Therezinha.

Ao todo, três pontos são monitorados. O primeiro local é o mais próximo das nascentes. Entre 2012 e 2014 a qualidade da água era considerada ruim, vindo a melhorar no ano de 2015, quando passou para regular. A melhora, segundo Therezinha, acompanhou a instalação da rede de esgoto.

Cômite Baía da Babitonga/Reprodução

O ponto dois fica próximo do encontro entre o Cachoeira e o rio Mathias. O trecho teve a qualidade da água considerada ruim entre 2011 e 2017, passando nos anos seguintes para regular. A mesma condição se repete no ponto três, localizado em trecho mais próximo da Baía da Babitonga.

Ainda que uma melhora foi registrada, Therezinha conta que não é recomendado o consumo da água do Cachoeira, que precisa passar por mais estudos. Para isso, é necessário preservar ainda mais, aumentar a rede de esgoto e não descartar lixo em locais irregulares para que, um dia, o Cachoeira recupere plena saúde.