Fernanda Silva
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Em meio aos tique-taques, Adolfo Kuchlik trabalha fazendo a manutenção de relógios há meio século em Joinville. Mesmo aos 74 anos, as pequenas peças, parafusos e engrenagens não fogem aos olhos atentos de quem já realizou a tarefa milhares de vezes.
Ser relojoeiro não era um sonho. Nascido na região de Canoinhas, no Planalto Norte, cresceu na roça. A família plantava feijão e soja.
Impulsionado pelo pai, fez um curso por correspondência para exercer a profissão, se formando aos 24 anos. “Ele dizia que era para eu ter uma profissão, para sair da roça”, lembra. Adolfo seguiu o conselho e, hoje, o diploma de relojoeiro segue pendurado na parede da relojoaria do bairro Costa e Silva, em Joinville.
Adolfo pegou gosto pelo ofício. Desde então, todas as manhãs, chega às 8 horas para começar os trabalhos na relojoaria que carrega seu nome. Ele segue trabalhando até o meio da tarde, quando volta para casa. Questionado sobre a possibilidade de se aposentar, afirma rindo: “O que eu vou fazer em casa? Não gosto de lavar a louça, limpar quintal. Eu vou é arrumar relógio”, brinca.
As ferramentas que usa para os consertos variam de novas às mais antigas. Uma delas, tem a mesma idade do diploma, 50 anos. Ganhou quando finalizou o curso. “É a melhor”, afirmam ele e a filha, Bruna Kuchlik, 31 anos, que seguiu os passos do pai e também é relojoeira.
Com orgulho, Adolfo afirma ser um dos poucos que ainda trabalha apenas com a manutenção de relógios. Atualmente, muitos relojoeiros compartilham os espaços das lojas com a venda de óculos e joias. Ele, por outro lado, preferiu seguir acompanhado apenas dos tique-taques.
Especialista no que faz, arruma desde relógios a pilha, eletrônicos ou de parede, que costumam ser expostos na loja. Com a experiência, sabe afirmar o que pode ou não ser arrumado. “Se [eu] não consertar, pode jogar fora porque não tem conserto”, afirma.
O relojoeiro lembra de um homem que veio inúmeras vezes arrumar um relógio de pulso, que voltava a parar. Em um atendimento, o cliente explicou que não costumava o usar com frequência, que às vezes, ficava na cabeceira da cama. “Relógio de pulso. Se não usar, ele vai estragar”, explica. Depois da dica, o relógio não estragou mais.
Afeto
Adolfo sabe que cada uma das peças que manuseia tem uma história. Com cuidado, solta as engrenagens e avalia o que precisa ser feito. Algumas coisas são simples, outras vezes precisa fazer restauros completos.
Durante a pandemia, houve um aumento na procura para manutenção de relógios mais antigos. “Muitos familiares que tiveram alguém que faleceu na pandemia, vinham procurar a gente para arrumar [o relógio]”, conta Bruna. De família para família, Adolfo e a filha puderam entregar um pouco mais de conforto para aqueles que perderam alguém e, então, puderam ter por perto uma boa lembrança.
Rodson Taruhn, 33, trabalha como atendente na Adolfo Relojoaria e afirma admirar a disposição e conhecimento do idoso. “São poucas as pessoas que continuam a fazer o que ele faz”, diz com admiração.
Começo de carreira
Adolfo não começou grande no ramo de relojoaria. Trabalhou cerca de um ano em uma cidade do Paraná, ganhando menos que um salário justo, apenas para pegar experiência.
Veio para Joinville em 1976 e teve dificuldades para conseguir emprego na área. “Como ia explicar minha experiência vindo de uma cidade pequena, que ninguém sabia”, conta.
Assim, foi empregado em uma fábrica, onde ficou por um ano e depois conseguiu um trabalho em uma joalheria. “Mas não estava tão bom. Me indicaram para outro lugar e foi aí que comecei a arrumar os relógios mesmo”, lembra.
Três anos após chegar a Joinville e pegar boa experiência, montou o próprio negócio, em 1979, no bairro Costa e Silva, no mesmo lugar que trabalha até hoje. “Vi a sala para alugar e já negociei na hora. Tinha umas ferramentas e montei aqui”, conta. No começo, Adolfo era indicado aos clientes por outros relojoeiros. A demanda de trabalho não possibilitava que os colegas pegassem todos os trabalhos, então ele era indicado.
Com o tempo, sua reputação e trabalho cultivaram a própria clientela. Foi assim, devagar e com paciência, que Adolfo conquistou seu espaço em Joinville. Hoje, a experiência de mais de 50 anos permite que seja uma referência nos consertos de relógios. “Esses dias, veio um homem da Enseada [em São Francisco do Sul], disse que somos um dos dez melhores a aparecer no Google”, conta orgulhoso.