Superlotação: presídio de Joinville tem mais que o dobro da capacidade de presos
Governo diz que problema é uma resposta aos altos índices de prisão na região
O Presídio Regional de Joinville apresenta superlotação. A unidade tem 1.126 detentos, número pouco maior que o dobro da capacidade, que é de 539 presos. Em alguns casos, o sistema prisional chega a abrigar 23 pessoas em uma cela para oito, conta um ex-funcionário, que preferiu não se identificar.
Com o debate da reforma da previdência estadual dentro da Assembleia Legislativa de SC (Alesc), protestos de funcionários de segurança evidenciaram a superlotação nas unidades prisionais do estado. No presídio de Joinville, por exemplo, são 140,7 detentos para cada um policial penal de plantão.
Na Penitenciária Industrial de Joinville, há uma agente de plantão para cada 18 presos. No local, com capacidade para 668 pessoas, são abrigadas 864. Dados são da Associação dos Policiais Penais e Agentes de Segurança Socioeducativos.
A superlotação não é um problema que afeta somente os detentos. Em entrevista ao jornal O Município Joinville, um agente prisional, que preferiu não se identificar, alegou que as unidades são insalubres tanto para presos, quanto para os demais funcionários. “Um policial penal já ficou afastado três meses porque contraiu tuberculose no trabalho”, afirma.
Para ele, as condições atuais das prisões impossibilitam um tratamento humanizado, com condições e direitos básicos para presos e trabalhadores. “Me trouxe um estresse porque você trabalha querendo fazer o melhor, mas te barram por falta de pessoal, equipamento, material de higiene”, desabafa.
A situação no trabalho afetou a saúde mental do agente, que passou a ficar estressado e com o psicológico adoecido. Há seis anos, ele pediu transferência da unidade de Joinville para São Francisco do Sul por conta da superlotação.
“Não consegue [o agente] desempenhar o papel que o Estado quer que desempenhe. Os materiais de higiene para os presos não são suficientes e de má qualidade. Como vou tratar bem uma pessoa? Como vou me sentir humano?” diz.
O policial penal Flávio Freitas da Mota, de 38 anos, também passou pelo mesmo problema. Com 14 anos de trabalho no sistema prisional catarinense, pediu transferência da unidade de Joinville para Barra Velha após seis anos atuando no local. “Estou ficando velho para aguentar a pressão de 1,1 mil presos. Pedi remoção de Joinville porque minha saúde estava se debilitando”, relata.
Segundo o agente, o dia a dia nas prisões exige força, saúde física e mental. Além de desempenharem o papel de polícia nas unidades, também atuam como mediadores, conta. “Imagine em uma cela aonde deveria ter oito [detentos] e tem 18 ou mais, e se as pessoas se desentendem? Vivermos 24 horas sobre tensão de brigas.”
Flávio afirma que a função que ele e outros companheiros exercem dentro da segurança pública é ignorada pelo estado, tornando as condições de trabalho precárias. “Somos a polícia invisível, que ninguém quer que seja lembrada”. Ele destaca que a reforma da previdência evidencia ainda mais o que considera um descaso com os trabalhadores.
Reforma da previdência
O policial penal conta quando iniciou a carreira em 2008, a média de idade dos presos era de 30 anos. Atualmente, esta taxa baixou para 22 anos. Por conta disso, se posiciona contra a proposta estadual para aumentar a idade da aposentadoria dos profissionais da segurança pública. Se o projeto for aprovado, os servidores deverão se aposentar após os 65 anos.
“Nós vamos envelhecendo e o governo está propondo uma reforma onde vamos ter que trabalhar até os 65 anos. Isso irá somente fortalecer a criminalidade, tendo em vista que não teremos forças para controlar o barril de pólvora que é a unidade prisional superlotada”, alega Flávio.
Direitos
O juiz titular da 3ª Vara Criminal e de Execuções Penais, João Marcos Buch, relata que em suas visitas no sistema prisional percebe que há uma certa precariedade tanto do cuidado com os presos, quanto com o trabalho dos agentes penais. “Vejo que muitos entram em um processo de adoecimento”. O magistrado também afirma que os trabalhadores não são reconhecidos pelo trabalho prestado.
Segundo Buch, o problema da super lotação afeta o sistema prisional como um todo. Inclusive, ele lembra que o pedido para vacinação contra a Covid-19 para as unidades prisionais também foi uma forma de evitar o contágio entre presos e funcionários.
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O juiz comenta que a situação afeta também o dia a dia dos trabalhadores destas unidades, um exemplo é a questão da saúde. Por isso, pontua que direitos precisam ser garantidos.
Um dos agentes prisionais destaca que, por conta do contato direto com os detentos, os agentes também estão suscetíveis a se infectarem com doenças transmissíveis, como a tuberculose e Covid-19, por exemplo.
Resposta para super lotação
De acordo com o Departamento de Administração Prisional (Deap), o problema da superlotação é uma resposta aos altos índices de prisão na região.
Para solucionar a questão, o Deap afirma que a Secretaria de Administração Prisional (SAP) está trabalhando na construção e ativação de cerca de 2 mil vagas nos próximos meses, sendo que a maioria delas é para o regime fechado.
Para a região Norte especificamente a construção da Penitenciária Industrial de São Bento do Sul – entre outras obras – poderá desafogar o sistema. Até o momento, 60% das obras estão concluídas e entrando em fase de acabamento e construção da muralha. Em São Bento são 426 vagas para regime fechado, e em Joinville, 286 vagas no Presídio Feminino e outras 147 nas obras de ampliação e reforma do Presídio Regional de Joinville.
Flávio, porém, discorda da solução dada pelo estado. “Hoje, não basta que se tenha uma unidade com o número de presos equivalente a capacidade, se não tem o número de servidores ideal para que os trabalhos sejam prestados com eficiência”, alega.
Outro agente também lembra que muitos presos estão no local provisoriamente, sem o julgamento, e que, portanto, poderiam estar em outros regimes de pena, evitando a super lotação. “Ressociabilizar [os detentos], oferecer educação, emprego, saúde. Ali, não conseguem fazer isso. Abarrotam de preso e é isso”, opina.
O juiz da 3º Vara Criminal de Joinville também não acredita na resposta dada pelo estado como solução. Em sua opinião, o mais correto seria investir em educação, esportes e outros direitos básicos, afastando crianças e adolescentes da criminalidade, o que evitaria muitos crimes e, consequentemente, prisões.
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